“Sacrifiquei todos meus deveres de mulher e depositei-os no altar da carreira. Valeu a pena? Não.”


Fonte:   https://7uvw.xyz/ladodireitodaequidade/celebridades/zoe-lewis/sacrifiquei-deveres-mulher-depositei-altar-carreira-valeu-pena/  

– Zoe Lewis, dramaturga inglesa, 2009.

Nunca pensei que alguma vez viria a dizer isto, mas ser uma mulher “livre” não é bem o que se pensa. Esse som que ouço será o das sufragistas se virarem nos seus caixões? Talvez.

A minha mãe era uma hippie que manteve uma colecção de livros (poeirentos) de Germaine Greer e Erica Jong junto à sua cama (tal como todas as boas feministas, ela nunca entendeu o porquê de ter que ser ela a fazer toda a limpeza doméstica). Ela incutiu em mim os grandes valores da escolha, igualdade e libertação sexual. Lutei contra o meu irmão mais velho e venci; na universidade ganhei dos rapazes de rugbi, em jogos de bebedeira. Comigo não se brincava.

Hoje, com 37 anos, esses mesmos valores fazem-me sentir um pouco fria. Quero amor e filhos mas nenhum deles está perto. Sinto-me como um inspetor da ONU enviado para o Iraque apenas e só para descobrir que nunca houve armas de destruição maciça.

Fui levada a acreditar que as mulheres poderiam “ter tudo” e, mais apropriadamente, que nós queríamos tudo. Tendo esse fim em vista, passei 20 anos a perseguir os meus sonhos de forma impiedosa – para ser uma bem sucedida “playwright”. Sacrifiquei todos os meus deveres femininos e depositei-os no altar da carreira profissional. E será que valeu a pena? A resposta só pode ser um não resoluto.

Há 10 anos atrás o The Times publicou um artigo em volta da minha peça “Paradise Syndrome”. Era baseado na vida das minhas amigas na indústria da música. Tudo o que fazíamos era fazer festas, trabalhar e beber. A peça esgotou e então pensei:

Pronto! É agora que vou ter tudo: sucesso, poder, e os homens vão-me desejar por isso.

Na verdade, isso foi o princípio de anos de trabalho árduo, cartas de rejeição e vida nas filas de pão.

Uma década depois escrevi a peça de continuidade com o nome “Touched for the Very First Time”, onde a Lesley, desempenhada por Sadie Frost, é uma jovem normal de 14 anos de Manchester que se enamora com a Madonna, em 1984, depois de ouvir a música “Like a Virgin”.

Ela segue religiosamente a ícone através dos anos enquanto Madonna vende o seu último sonho: “Tu podes fazer tudo – ser o que quiseres – segue em frente, miúda.”

Lesley descobre ao mesmo tempo que Madonna que tentar “ter tudo” é um grande jogo. Escrevi esta peça porque muitas das minha amigas foram inspiradas por esta mulher teimosa que nos permitiu ser fortes e sexy. Ainda a amo e sempre a hei-de amar, mas ela encorajou-nos a perseguir uma fantasia, o que é uma grande desilusão.

Eu posso até ser um caso extremo. Os meus pontos de vista podem não representar o que as outras mulheres da minha geração pensam. Será que eu apenas sou uma miúda mimada da classe-média que teve uma carreira profissional que apenas mudou de forma de pensar? Acho que não.

Este mês a “General Household Survey” observou que o número de mulheres solteiras com menos de 50 anos aumentou mais do que o dobro durante os últimos 30 anos. E aos 30 anos, uma em cada cinco destas “freemales” (free + females, livres + femininas) que escolheu a independência em vez dum marido, já atravessou uma coabitação falhada.

Eu argumento que as liberalistas das mulheres dos anos 60 e anos 70 colocaram o carreira profissional em primeiro plano, pisando o papel tradicional das mulheres por baixo dos seus Doc Martens. Quem me dera que uma visão mais balanceada da mulher tivesse estado à minha disposição. Quem me dera que ser uma dona de casa ou uma mãe não fosse uma ideia tão tóxica para as liberais da classe média do passado.

Um número cada vez maior das minhas amigas feministas está a desistir das sua carreiras em favor do amor, das crianças e da cozinha. Quem me dera ter tido filhos há 10 anos atrás, quando o tempo estava do meu lado, mas o problema não foi o tempo mas a mentalidade. Tomei a decisão consciente de não ter relacionamentos sérios porque pensei que tinha todo o tempo do mundo. Muitas das minhas amigas fizeram o mesmo.

Isto resume-se em entender o que é realmente importante na vida, e pelo que já vi e pelo que sinto, relacionamentos amorosos e as crianças trazem mais felicidade que o trabalho alguma vez poderia trazer.

Natasha Hidvegi, de 37 anos, deixou o seu trabalho como cirurgiã para se dedicar ao seu filho.

Descobri que era impossível ser uma boa mãe e uma boa cirurgiã. Embora tenha sido uma decisão horrível, não me arrependo.

Sempre pensei que as homens gostariam de mulheres independentes e fortes, mas (no geral) não parece ser esse o caso. Eles não tem culpa. Não está nos seus genes.

Holly Kendrick, de 34 anos e com um emprego de elevado estatuto no teatro, concorda:

Os homens tem tendência a ficar perturbados quando as mulheres trabalham tanto como eles.

É por isso que muitas das minhas amigas estão sozinhas.

A verdade, no entanto, não é que os homens não tenham aceite a modernidade feminina – a mulher alfa que nunca questiona o seu direito de ter os mesmos empregos, a mesma diversão e a mesma gratificação sexual que os homens – mas sim que as mulheres não aceitaram.

Eu sinto uma pressão enorme por parte das mulheres da minha geração, que tem cônjuges e filhos, para nos juntarmos ao seu clube. Aos seus olhos eu não sou a indicadora dum novo percurso mas sim uma falhada. A minha amiga Rita Arnold, de 36 anos, trabalha em Marketing.

Não são os homens que me julgam por ser uma carreirista. São as outras mulheres. As garras saem para fora.

Isto deixa-me doente. Nós estamos a desiludir-mo-nos umas as outras mas há uma traição ainda maior. Eu sou uma falhada aos meus próprios olhos. Algures dentro de mim espreita uma mulher que eu não posso controlar. Ela está na cozinha com um bebé à cintura e com massa de farinha nas mãos e a olhar para mim de cima para baixo. Ela diz-me:

Isto é felicidade, tudo resume-se a isto.

É um instinto que faz de mim uma mulher, um instinto que eu não posso ignorar mesmo que quisesse.

Felicity Wren, 36 anos, é uma atriz que ainda busca o sr Perfeito. “Sinto a pressão, mas apenas de mim própria, porque eu não tenho uma vida convencional. A maior parte das pessoas não se importa.”

Se eu tivesse este entendimento da minha natureza há 10 anos atrás, eu teria despromovido a minha escrita (e o hedonismo) e buscado vigorosamente um relacionamento. Houve muitos homens e mesmo uma proposta de casamento, mas eu não queria desistir dos meus sonhos.

Falei com as jovens que eram o assunto da minha peça “Paradise Syndrome” em 1999. Sas Taylor, 38 anos, solteira e sem filhos, gere a sua companhia de Relações Públicas:

Durante os meus anos 20 eu sentia-me invencível. … Mas agora eu gostaria de ter feito as coisas de forma diferente. Parece que assusto os homens por ser tão capaz [profissionalmente]. Tenho um bem sucedido negócio mas isso não te faz feliz.

Nicki P, 35 anos e solteira, trabalha na indústria musical e acrescenta:

No passado era tudo um jogo, mas agora estou em pânico. Ninguém me disse que divertir-me não era tão divertido como pensava.

À medida que escrevo isto, sinto-me triste, como se os princípios feministas que a minha mãe me ensinou estejam a ser lançados no lixo. Será que estou a trair a feminilidade? Não; estou apenas a revelar uma verdade vergonhosa.

As mulheres geralmente são as maiores inimigas do feminismo devido à nossa composição genética. Nós temos um tempo limitado para sermos mães e quando o tique-taque do relógio começa, nós abandonamos a nossa força e saltamos, esquecendo os tempos de entrega e as apresentações de PowerPoint em favor de carrinhos de bebé e os tempos de ovulação.

Nem todas as mulheres querem filhos mas desafio uma mulher a dizer que não quer ter um relacionamento amoroso. Quem me dera ter tido o conselho que estou a dar à minha irmã de 21 anos:

Se encontrares um bom homem, não tenhas medo de assentar e ter filhos uma vez que não perdes nada que não possas fazer mais tarde (excetuando ter filhos).

Espero que no futuro haja um melhor entendimento da mulher por parte da mulher. Os últimos 25 anos foram confusos e sinto-me apanhada em fogo cruzado. Como mulheres nós devíamos aceitar-mo-nos umas as outras em vez de apenas apreciarmos o “sucesso”. Sempre senti uma pressão enorme para ser bem sucedida como forma de mostrar aos homens que sou igual a eles. A mulher e a mãe deveriam ter paridade com a o papel de mulher de carreira na mente das feministas.

A minha mãe teve filhos cedo e de forma brilhante fez malabarismo entre uma carreira de produtora de cinema e ser progenitora. Ela fazia parte duma geração na encruzilhada: tinham valores feministas mas tinham filhos cedo. Não teve as oportunidades de emprego que a nossa geração possuiu; ela teve que aceitar trabalhos menores de forma a estar presente nas noites paternais.

A escolha e a carreira são vitais, claro, mas nenhuma delas deve ser perseguida de forma impiedosa. Gosto de ser escritora e ainda tenho o meu sonho, mas agora estou a enfrentar os fatos.

O que melhor me fez sentir na vida foi estar apaixonada pelo meu ex-namorado, e o que me faz sentir mais focada é estar no campo com crianças, cães, e, sim, talvez na cozinha.

– Zoe Lewis, “As a successful playwright this woman should have the world at her feet. So why, at 36, does she feel bitterly unfulfilled?”, Daily Mail, 10.02.2009. http://www.dailymail.co.uk/femail/article-1140543/As-successful-playwright-woman-world-feet-So-36-does-feel-bitterly-unfulfilled.html

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